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Saiba mais sobre PSA e toque no câncer de próstata

O câncer de próstata (CaP) permanece como a neoplasia sólida mais comum e a segunda maior causa de óbito oncológico no sexo masculino. Dados da Organização Mundial de Saúde (OMS) preveem para o ano de 2015 o diagnóstico de 1.201.619 novos casos e 335.643 óbitos no mundo pela doença, o que corresponde a aumento em relação ao ano de 2012 de 9,7% e 9,2%, respectivamente. (1) No Brasil, a mesma instituição prevê 79.882 novos casos e 18.850 óbitos no mesmo período, o que significa que ainda quase 25% dos portadores de câncer de próstata morrem devido à doença. (2)

Atualmente, cerca de 20% dos pacientes portadores de câncer de próstata ainda são diagnosticados em estágios avançados, embora um declínio importante tenha ocorrido nas últimas décadas em decorrência principalmente de políticas de rastreamento da doença e maior conscientização da população masculina. (3)

Entretanto, muita controvérsia ainda existe com relação aos méritos do rastreamento. Vários estudos randomizados a respeito da associação do rastreamento com mortalidade por CaP foram realizados. No entanto, há problemas relacionados à metodologia e condução dos mesmos, seguimento curto, resultados conflitantes e o pequeno benefício em termos de taxas absolutas de redução de mortalidade.

Não existe consenso entre as organizações de saúde a respeito do rastreamento do câncer de próstata. Aquelas contrárias argumentam que não existem evidências conclusivas de que a detecção precoce tenha influência na mortalidade específica por CaP, além do fato de pacientes em rastreamento estarem expostos às complicações e aos efeitos colaterais de um possível tratamento desnecessário. Aquelas a favor da prática argumentam que existem evidências de que o rastreamento é responsável pelo declínio da mortalidade em determinadas áreas. As Sociedades de Urologia Americana, Europeia e Brasileira indicam o rastreamento baseadas em estudos randomizados de grande porte e longo seguimento.

O rastreamento universal de toda população masculina (sem considerar idade, raça e história familiar) não parece ser a melhor abordagem. Apesar de associado ao diagnóstico precoce e diminuição da mortalidade, pode trazer malefícios a muitos homens. Individualizar a abordagem é fundamental neste sentido.

A identificação de pacientes com alto risco de desenvolverem a doença de uma forma mais agressiva através de parâmetros clínicos ou laboratoriais pode ajudar a individualizar a indicação e frequência do rastreamento. Entre diversos fatores, a idade, a raça e a história familiar apresentam-se como os mais importantes.

Outro ponto é o oferecimento da observação vigilante como forma de tratamento na doença de baixo risco. Esta abordagem consiste em avaliações periódicas através de toque retal, PSA e biópsia prostática em intervalos variados, com tratamento definitivo, caso seja identificada progressão da doença, poupando pacientes com tumores indolentes das consequências do tratamento radical. Atualmente cerca de 57% dos pacientes com CaP de baixo risco nos EUA gostariam de ser tratados através dessa modalidade. Entretanto, apenas 10% dos portadores de CaP seguem protocolos de observação vigilante. A conscientização dos profissionais envolvidos na assistência do paciente com CaP é fundamental nesse sentido.

Em outubro de 2011, o US Preventive Services Task Force (USPSTF) publicou intenção de modificar suas recomendações para o rastreamento em câncer de próstata, passando seu grau de recomendação de C para D, ou seja, sugerindo sua não realização. Uma reação imediata foi vista por parte de especialistas e algumas Sociedades Médicas, não sendo em geral bem recebida.

As críticas do USPSTF aos recentes estudos sobre o rastreamento já são bem conhecidas:

Com relação aos dois recentes estudos publicados no último ano (o PLCO feito nos EUA e o ERSPC na Europa), vários vieses e falhas metodológicas podem ser identificados. Inicialmente, no próprio recrutamento do estudo americano. Vários pacientes selecionados para o estudo já haviam feito teste de PSA antes de sua inclusão, tornando a população do estudo provavelmente de bom prognóstico, pré-selecionada. Já no estudo europeu, a dosagem do PSA foi realizada a cada quatro anos, uma forma de rastreamento ainda longe de ser o consenso. Apesar de mostrar diminuição de cerca de 20% do risco relativo de óbito por CaP nos pacientes rastreados, houve uma redução do risco absoluto de apenas 7,1 para cada 10.000 homens rastreados. O alto número de pacientes tratados (NNT) para se prevenir um óbito (48) também é um ponto importante. Ambos os estudos ainda possuem um tempo de seguimento curto, longe de ser ideal para se avaliar sobrevida com relação ao câncer de próstata.

Por outro lado, o USPSTF cometeu algumas “falhas” na sua avaliação:

  • Desconsiderou fatores de risco importantes para o desenvolvimento do CaP, como idade, história familiar e raça.
  • Desconsiderou redução de 40% na mortalidade por câncer de próstata nos EUA desde o início da prática do rastreamento.
  • Desconsiderou a importante redução da mortalidade observada em pacientes do ERSPC entre 55 e 65 anos, o que suporta a manutenção do grau de recomendação C nesta faixa etária.
  • Considerou equivalentes os resultados dos estudos americano e europeu, ignorando as falhas de recrutamento, contaminação (52% dos pacientes do grupo controle) e curto seguimento do PLCO.
  • Não considerou resultados recentemente publicados sobre o rastreamento em Göteborg, que mostrou uma redução importante (44%) no risco de óbito por CaP na população rastreada após seguimento de 14 anos, com diminuição do NNT para 12.6.

Vale ressaltar que no grupo do Task Force que indicou o não rastreamento não havia urologista nem oncologista, especialidades responsáveis pelo diagnóstico e tratamento da doença.

Outro ponto importante deste debate é a própria medida do benefício do rastreamento. Sobrevida global talvez não seja o melhor desfecho para se avaliar a eficácia do rastreamento. Em câncer de mama, por exemplo, a mamografia também não diminui a mortalidade geral das pacientes. O rastreamento atua na mortalidade específica por câncer (além de se questionar o benefício de cirurgias mais conservadoras e diminuição de quimioterapia ou hormonioterapia adjuvantes). O impacto do rastreamento sobre mortalidade câncer específica, a qualidade de vida, a diminuição de metástases, dor ou outros benefícios não podem ser avaliados nesses trabalhos.

Como esperado, as consequências da equivocada resolução da USPSTF começam a aparecer. Trabalho apresentado no 2015 Genitourinary Cancers Symposium pode provocar ainda mais discussão sobre o tema e reforçar o papel do rastreamento. Foram avaliados retrospectivamente 87.562 novos casos diagnosticados entre 2003 e 2013 em 150 instituições nos EUA. Foi demonstrado que após a recomendação da U.S. Preventive Services Task Force (2011) contra o rastreamento, houve um aumento de 3% ao ano no diagnóstico de tumores de risco intermediário e alto risco. (4) Outra publicação recente mostrou redução no número de diagnóstico de tumores agressivos, o que cria preocupação de que o diagnóstico atrasado em casos importantes de câncer de próstata pode representar pior resultado oncológico no futuro. (5)

A Sociedade Brasileira de Urologia mantém sua recomendação de que homens a partir de 50 anos devem procurar um profissional especializado para avaliação individualizada. Aqueles da raça negra ou com parentes de primeiro grau com CaP devem começar aos 45 anos. O rastreamento deverá ser realizado após ampla discussão de riscos e potenciais benefícios. Após 75 anos, deverá ser realizado apenas àqueles com expectativa de vida acima de 10 anos.

 

 

Fonte: Sociedade Brasileira de Urologia
Gestão 2014/2015
Novembro de 2015

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